RIO - Botafogo surpreendeu e saiu na frente da Lagoa e outras áreas mais ricas no novo indicador criado pela prefeitura para medir o desenvolvimento socioambiental na cidade. O Índice de Progresso Social (IPS) Rio, apresentado nesta segunda-feira pelo Instituto Pereira Passos (IPP), leva em conta desde mortalidade infantil a degradação de áreas verdes e mobilidade. Com isso, a Região Administrativa de Botafogo (que inclui ainda bairros como Catete, Cosme Velho, Flamengo, Laranjeiras e Urca) ficou em primeiro lugar, à frente da RA da Lagoa (composta também por bairros como Gávea, Ipanema, Jardim Botânico, Leblon e São Conrado). Contribuiu para isso o fato de a primeira área contar com metrô e ter menos favelas que a segunda.
— Na RA da Lagoa, estão comunidades como as do Vidigal, do Parque da Cidade, da Chácara do Céu — explica o presidente do IPP, Sérgio Besserman. — Os bairros da RA de Botafogo têm menos população morando em favelas do que os da RA da Lagoa. Botafogo, Flamengo, Catete e Glória também são bem servidos por transporte público e contam com estações do metrô.
No posto de lanterninha, ficou a RA da Pavuna (onde estão ainda Barros Filhos e Costa Barros).
O IPS varia de 0 a 100 e é calculado levando em consideração 36 indicadores. Entre eles, estão acesso a água canalizada e esgoto sanitário, taxa de homicídios, incidência de dengue, mortalidade por tuberculose e HIV, homicídios de jovens negros e frequência no ensino superior. Não são levadas em conta variáveis econômicas, como renda.
— O índice é uma ferramenta que ajuda acompanhar as mudanças e a direcionar as políticas públicas — explica Besserman.
Além do Rio, no Brasil, apenas o IPS de municípios da Amazônia é calculado. O índice é medido em cidades da União Europeia, dos Estados Unidos, da Colômbia, da Costa Rica, do Paraguai e do Peru. O IPS Rio é uma iniciativa da Rede #ProgressoSocialBrasil, realizada pelo IPP, em parceria com o Social Progress Imperative (SPI) e com o apoio da Fundación Avina e da Fundação Roberto Marinho.
Nascido em Botafogo, onde voltou a morar há 13 anos, o fotógrafo Paulo Camarão, de 56 anos, destaca a centralidade do bairro, que se sai bem no quesito mobilidade. Ele diz ainda que o perfil de Botafogo está mudando, com a expansão de um comércio mais sofisticado e a chegada de novos bares e restaurantes, que vêm influenciando no lazer dos moradores. As praças, segundo ele, também pesam a favor, por estarem em melhores condições que anos atrás.
— Botafogo, além de charmoso, é um bairro que está no meio do caminho. A Lapa está perto, assim com o Baixo Gávea. Para Copacabana, é um pulo, e, se precisar ir para o Galeão, é só pegar o Rebouças. Temos bastante transporte público, incluindo um metrô que atende bem o miolo do bairro, embora o trânsito seja péssimo, principalmente no horário de saída das escolas — afirma ele, que aponta ainda os assaltos nas ruas como outro problema a ser olhado com atenção. — A sensação de insegurança aumentou muito no bairro de um ano e meio para cá.
NA PAVUNA, FAVELIZAÇÃO E ABANDONO
As RAs de Botafogo (IPS 86,90) e da Lagoa (85,18) estão bem na frente do índice médio da cidade, que alcançou 60,70. Foram avaliadas 32 das 33 Regiões Administrativas. Só Paquetá ficou de fora, porque os técnicos consideram que a ilha tem uma população pequena, e os dados poderiam não ser representativos. A pesquisa mostrou ainda que, nas 12 RAs com IPS superior ao da média da cidade, vivem pouco mais de um terço (38%) dos moradores do município.
Na média, a cidade foi mais bem avaliada em água e saneamento (83,72). O pior indicador foi o de acesso à educação superior (32,36), embora técnicos ressaltem que, nesse caso, são usados dados do último censo demográfico (2010), os únicos disponíveis. No entanto, 33% das informações utilizadas para calcular o IPS são de 2014 e 22%, de 2015
Na Pavuna, um dos indicadores que puxaram a região para baixo foi o da degradação das áreas verdes. A área perdeu nada menos que 13% de cobertura vegetal entre 2013 e 2015. É a Pavuna também que tem na cidade a maior taxa de homicídios dolosos cujas vítimas são jovens de 12 a 26 anos, de cor preta, parda ou negra: 29,06 casos por cem mil habitantes.
Nascido e criado na Pavuna, o gerente de vendas Bernardo Santos, de 50 anos, conta que testemunhou ao longo dos anos a transformação do bairro: antes um lugar agradável para viver, agora tem uma rotina de violência, trânsito congestionado e carência de serviços e órgãos públicos. As dificuldades enfrentadas pelos moradores são contadas na página Pavuna da Depressão, criada no Facebook no mês passado, na qual ele atua como moderador.
— A Pavuna virou uma espécie de ilha cercada por favelas controladas pelo tráfico por todos os lados. Isso se reflete nas estatísticas de assaltos, homicídios e roubos de veículos no bairro. O fato de ser vizinho à Linha Vermelha e à Via Light também transforma o bairro numa via de passagem. Aparentemente, fomos esquecidos pelo poder público. Algumas repartições públicas que atendiam a população foram transferidas ao longo dos anos para outros bairros — conta Bernardo.
Com IPS 70,83, a Barra está na sexta posição do ranking. Pesaram contra a região problemas relativos a água canalizada, população vivendo em favelas não urbanizadas e mobilidade urbana. Já a RA de Vila Isabel, que tem algumas das menores taxas de homicídio e violência contra a mulher, ficou em quinto lugar, atrás de Tijuca (quarta colocação) e Copacabana (terceira).
DESIGUALDADES NA CIDADE
Das RAs que concentram complexos de favelas, as de Vigário Geral e da Maré são as mais bem classificadas: 22º e 23º lugares, respectivamente. A Cidade de Deus ficou em 25º e a Rocinha, em 29º. Na Rocinha, são registradas 39,61 internações por crise respiratória aguda a cada mil crianças, o dobro da segunda taxa mais alta (18,24 na Cidade de Deus) e muito acima da média da cidade (8,48).
— Uma das principais mensagens do relatório é que há desigualdade no Rio. Enquanto duas regiões administrativas (Botafogo e Lagoa) têm uma pontuação de progresso social muito alta, superior a 85, seis RAs apresentam índices muito baixos (Guaratiba e Zona Portuária, além de Rocinha, Jacarezinho, Complexo do Alemão e Pavuna). Para ilustrar o que essa desigualdade significa na rotina dos cariocas: apenas 1% dos habitantes da região do Jacarezinho têm curso superior completo, frente aos 58% da Lagoa — diz Michel Green, diretor-executivo do Social Progress Imperative.
Para o presidente do Instituto de Arquitetos do Brasil no Rio (IAB-RJ), Pedro da Luz, o IPS vai permitir à cidade gerir sua qualidade de vida daqui para frente:
— Mais que uma fotografia atual, o índice será importante na sequência histórica a longo prazo, quando veremos se a cidade está indo numa direção de melhor qualidade de vida no seu dia a dia. É um instrumento fundamental para a população cobrar providências. Pelo levantamento, a Pavuna tem muito pouca área verde, fator que degrada a condição de vida. Mas por que não se pode criar um parque na Pavuna? Os índices só têm sentido na medida em que possuem rebatimento no cotidiano das pessoas.
0 comentários:
Postar um comentário